Por que alguns pacientes tratam a terapia como um compromisso descartável, mas exigem dedicação total?
- Juliana Myrian
- 15 de ago.
- 3 min de leitura

Sou psicóloga e gostaria de trazer uma reflexão. Meu tempo é mais do que um espaço na agenda. É o alicerce onde coloco minha expertise, energia emocional e dedicação para acompanhar cada paciente em sua jornada terapêutica.
Esta semana, vivi uma situação que reflete um desafio recorrente na profissão: uma paciente faltou a duas consultas consecutivas, com justificativas frágeis comunicadas minutos antes. Na primeira sessão ela informou que, embora tivesse agendado, não se programou para o horário e simplesmente esqueceu. Na segunda, disse que não poderia comparecer porque não organizou um espaço adequado para o atendimento online e não conseguiria se concentrar. O impacto foi duplo: perdi a oportunidade de atender outros pacientes que aguardavam por um horário e sofri um prejuízo financeiro. Mais do que isso, senti meu trabalho desvalorizado.
Minha agenda é planejada mensalmente, com horários disponíveis geralmente apenas para daqui a duas ou três semanas. Cada falta não é apenas uma lacuna no cronograma; é uma interrupção no fluxo do processo terapêutico e uma barreira para outros que buscam atendimento.
Diante dessas faltas, tomei uma decisão que pode parecer radical, mas reflete a necessidade de estabelecer limites: Optei por não mais atender essa paciente. Não se trata de punição, mas de respeito mútuo. Às vezes, só reconhecemos o valor de algo quando enfrentamos sua ausência.
Psicólogos são profissionais liberais e operam com autonomia, aplicando conhecimentos técnicos e científicos regulamentados por conselhos profissionais. Temos liberdade para estruturar nossa prática, mas também carregamos a responsabilidade por nossas escolhas e pelo impacto de nossas ações.
Ao reservar um horário, o psicólogo oferece um espaço de escuta, técnica e acolhimento. Faltas por desorganização, comprometem não apenas a sustentabilidade financeira do profissional, mas também o vínculo terapêutico, que é o coração do processo de terapia.
O vínculo terapêutico é a relação de confiança, respeito e colaboração construída entre psicólogo e paciente, essencial para o sucesso do trabalho terapêutico. Ele se baseia na escuta ativa, na empatia e no compromisso mútuo de ambas as partes em direção a objetivos comuns. Esse vínculo no entanto é frágil e depende da reciprocidade. Quando o paciente desrespeita repetidamente o tempo do psicólogo, o vínculo é abalado.
No meu caso, as justificativas da paciente revelaram uma falta de priorização do processo terapêutico, comprometendo a base de confiança necessária para o trabalho. Encerrar o atendimento foi uma decisão difícil, mas necessária, pois o desrespeito ao meu tempo, sinalizou uma quebra no compromisso mútuo. O término do vínculo terapêutico, nesse contexto, é uma afirmação de que o respeito pelo tempo de ambos é indispensável para a continuidade da relação.
A importância de se organizar para a consulta não pode ser subestimada. O agendamento de uma sessão de terapia é um compromisso que exige planejamento, seja reservando um horário sem conflitos, seja garantindo um ambiente adequado para o atendimento, especialmente no formato online. A falta de planejamento por parte do paciente, não é responsabilidade do psicólogo. O profissional não pode ser punido, financeira ou emocionalmente, pela desorganização do paciente.
O psicólogo se prepara para cada sessão, dedicando tempo e energia para oferecer um atendimento de qualidade. Quando o paciente não corresponde a esse compromisso, o prejuízo recai não apenas sobre o profissional, mas também sobre outros que poderiam ter se beneficiado daquele horário. Respeitar o tempo do psicólogo é reconhecer que ele é finito, cuidadosamente planejado e essencial para o equilíbrio entre a qualidade do atendimento e a saúde do profissional. Organizar-se para a consulta é um ato de compromisso com o próprio processo terapêutico e com a relação de confiança mútua.



