Mononucleose e Relações Superficiais: Uma Reflexão Sociológica
- Juliana Myrian
- 25 de abr.
- 3 min de leitura
Atualizado: 3 de mai.

A mononucleose infecciosa, popularmente conhecida como "doença do beijo", é uma infecção viral causada principalmente pelo vírus Epstein-Barr (EBV), pertencente à família dos herpesvírus. Transmitida por meio de saliva, a doença pode se espalhar através de beijos, compartilhamento de utensílios ou contato próximo. Seus sintomas incluem febre, dor de garganta, fadiga extrema, aumento dos linfonodos e, em alguns casos, complicações como inflamação do fígado ou baço. Embora geralmente benigna, a mononucleose pode levar semanas ou meses para uma recuperação completa, especialmente em adolescentes e adultos jovens, que são os mais afetados.
O apelido "doença do beijo" reflete sua associação com interações íntimas, o que nos leva a explorar sua conexão com dinâmicas sociais modernas, especialmente as relações superficiais características da contemporaneidade.
Mononucleose e Relações Superficiais
A transmissão da mononucleose, frequentemente ligada a momentos de intimidade física, como beijos casuais, pode ser vista como um símbolo das interações fugazes e descompromissadas que marcam as relações contemporâneas. Em um contexto de relações líquidas, como descrito por Zygmunt Bauman, as conexões humanas muitas vezes carecem de profundidade e compromisso, privilegiando o imediatismo e a gratificação instantânea. A mononucleose, nesse sentido, pode ser interpretada como uma metáfora biológica para os riscos de interações que, embora prazerosas no momento, podem deixar consequências duradouras.
Bauman, em sua obra Amor Líquido (2003), argumenta que as relações modernas são marcadas pela fragilidade e pela busca constante por liberdade individual, o que resulta em laços descartáveis e efêmeros. O beijo, ato que pode transmitir o EBV, torna-se um emblema dessas conexões passageiras, nas quais a troca física não é acompanhada de um vínculo emocional sólido. Assim como a mononucleose pode se manifestar semanas após o contato inicial, as implicações de relações rasas podem surgir tardiamente, seja na forma de vazio emocional ou, no caso da doença, de sintomas debilitantes.
Outro teórico relevante é Anthony Giddens, que em A Transformação da Intimidade (1992) discute como a modernidade trouxe uma "democratização" das relações, mas também uma superficialidade nas interações amorosas e sexuais. Giddens aponta para a prevalência de "relações puras", baseadas em trocas momentâneas e autônomas, que se alinham com o comportamento de encontros casuais onde a mononucleose pode se disseminar. A ausência de compromisso nessas interações reflete uma sociedade que valoriza a autonomia, mas que também enfrenta os riscos de uma desconexão emocional.
Além disso, Jean Baudrillard, em sua análise da sociedade de consumo, sugere que as relações humanas foram reduzidas a trocas simbólicas, onde o prazer imediato prevalece sobre a construção de laços significativos. Em O Sistema dos Objetos (1968) e outras obras, Baudrillard descreve um mundo onde as interações são consumidas como produtos, descartáveis e desprovidas de profundidade. O ato de beijar, que pode transmitir a mononucleose, insere-se nesse contexto como uma troca simbólica que, embora intensa no momento, pode carregar consequências inesperadas.
Reflexões Finais
A mononucleose, ao ser transmitida em momentos de intimidade física, nos convida a refletir sobre a natureza das relações contemporâneas. As ideias de Bauman, Giddens e Baudrillard iluminam como a busca por conexões rápidas e descompromissadas, embora sedutora, pode trazer riscos, sejam físicos, como a infecção pelo EBV, sejam emocionais, como a solidão decorrente de laços frágeis. Assim, a "doença do beijo" não é apenas um problema médico, mas também um espelho das dinâmicas sociais que moldam nossas interações, desafiando-nos a buscar relações mais profundas e significativas em um mundo líquido.



